Chico Buarque ⋅ Mulheres de Atenas [Meus Caros Amigos, 1976]



Mulheres de Atenas

Mirem-se no exemplo
Daquelas mulheres de Atenas
Vivem pros seus maridos
Orgulho e raça de Atenas

Quando amadas, se perfumam
Se banham com leite, se arrumam

Suas melenas
Quando fustigadas não choram
Se ajoelham, pedem imploram
Mais duras penas; cadenas

Mirem-se no exemplo
Daquelas mulheres de Atenas

Sofrem pros seus maridos
Poder e força de Atenas

Quando eles embarcam soldados
Elas tecem longos bordados

Mil quarentenas
E quando eles voltam, sedentos
Querem arrancar, violentos
Carícias plenas, obscenas

Mirem-se no exemplo
Daquelas mulheres de Atenas

Despem-se pros maridos
Bravos guerreiros de Atenas

Quando eles se entopem de vinho
Costumam buscar um carinho

De outras falenas
Mas no fim da noite, aos pedaços
Quase sempre voltam pros braços
De suas pequenas, Helenas

Mirem-se no exemplo
Daquelas mulheres de Atenas:

Geram pros seus maridos
Os novos filhos de Atenas

Elas não têm gosto ou vontade
Nem defeito, nem qualidade

Têm medo apenas
Não tem sonhos, só tem presságios
O seu homem, mares, naufrágios
Lindas sirenas, morenas

Mirem-se no exemplo
Daquelas mulheres de Atenas

Temem por seus maridos
Heróis e amantes de Atenas

As jovens viúvas marcadas
E as gestantes abandonadas

Não fazem cenas
Vestem-se de negro, se encolhem
Se conformam e se recolhem
Às suas novenas, serenas

Mirem-se no exemplo
Daquelas mulheres de Atenas

Secam por seus maridos
Orgulho e raça de Atenas



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